Por Eduardo Serique
Nossa pobre metafísica
Não nos permite ver
A alma das árvores,
Dos bichos e dos rios
subindo ao céu no fumo
Das queimadas.
Triste metafísica a nossa:
Olhamos para o céu no clarão do dia
E o que vemos são nuvens
E um bando de urubus
Voando sobre nossas cabeças.
Sem nunca ter ouvido falar dos Zoés,
O poeta Antônio Carlos Maranhão
Chamava os urubus
De “anjos negros”.
De fato,
Os Zoés cremam seus mortos
Com um naco de carne de caça
Para dar de paga ao urubu
Que conduzirá a alma
Do falecido ao paraíso celeste.
A faina dos urubus
Talvez seja essa:
Levar a carne dos bichos
Mortos nas queimadas
O mais próximo de suas almas
Para a despedida
Que não pôde ser cumprida.
Li algures que as andorinhas
Carregam água no bico
De reserva em seus voos
Transcontinentais.
Talvez elas façam para os rios
O que os urubus fazem
Para os bichos.
Para mim ainda é um mistério
Essa ave que atravessa
O céu nas madrugadas,
Carregando carvão no bico.
Quão enganadora e fraudulenta
A nossa metafísica:
Engendramos um inferno de fogo
E nele atiramos
Tudo o que é outro,
Acreditando que com isso
Alcançamos o paraíso
Que inventamos para nós mesmos!