O barro, a terra amazônica, a matéria prima usada pela artista e artesã chilena Marlene Molina Soto revelou aos participantes da sua Jornada Formativa do projeto Gaia d´barro um lado inesperado, inclusivo e terapêutico. Marlene mistura de maneira holística sabedoria ancestral e observações na natureza com materiais contemporâneos. A princípio ela ensina a construir com barro extraído do próprio terreno onde fica a construção. Desenvolveu a própria técnica de levantar paredes com barro, o qual mistura com fibras aquáticas, reboca e por fim pinta com tintas naturais que usam tapioca na composição. Além de ensinar sobre o barro, a bioconstrução e a permacultura em geral, Marlene praticou na sua última aula da jornada formativa a inclusão. Convidou a ASSIC - Associação Santarena para Inclusão de Pessoas Cegas e de Baixa Visão de Santarém – a participar o que levou a ensinos inesperados e uma troca de experiências muito ricas com os participantes da aula. Mostrou que o barro vai muito além. Revelou nesta última aula seu lado terapêutico, fez literalmente todos os envolvidos enxergar de outra maneira.
Marlene trazendo o animado grupo de pessoas cegas e de baixa visão que luta com sua Associação Santarena para Inclusão
Marlene nos conta:
Muito edificante nossa prática de construir, fazer aula para pessoas com capacidades diferentes, todos com força, firmeza e fé no aprendizado. Sou muito agradecida pela oportunidade!
Os participantes aprenderam que ver com as mãos vai muito além da textura e estrutura que os dedos sintam. Tem o odor, a temperatura e o som que completam as informações de ver, ver de uma maneira diferente.
Chega o barro bruto de escavação
E as fibras aquáticas que permitem sustentação e não deixam o barro rachar
Foi a aluna fiel e desempenhada Aline Teixeira que resumo no seu depoimento tocante o que aprendeu nessa aula toda especial:
Essa foi mais uma das aulas de barro que venho fazendo, poderia ser só mais uma aula comum, mas foi com um grupo, ASSIC (Associação Santarena para Inclusão de Pessoas Cegas e de Baixa Visão de Santarém). Uff que aula, entrei e sai chorando. Sou muito emotiva kkk... na hora me vieram várias sensações e não consegui organizar a cabeça. Agora refletindo um pouco mais consigo colocar melhor em palavras.
Todos temos lutas diárias, eu como mulher e mãe tenho meu grupo que me identifico, outras pessoas dentro das suas lutas, têm seus grupos. E, não diferente de nós, as pessoas Cegas e de Baixa visão têm o grupo delas, com suas lutas, tentando ser inclusas no mundo apesar de serem "diferente do todo". Cada um, que não são melhores nem piores, às vezes se fecham aí no seu mundinho. No meu caso me fecho com as feministas e mães solos. Quando me deparo com um grupo, igualmente lutando, me faz perceber quão importante é ser reconhecido, não só pra validação de que somos seres que precisam de mais voz, mas também para sermos inspiração pra os demais!
Dentro da ASSIC, um deles Felipe Nogueira, cego, instrutor físico, matemático e lutador, e todos os demais com suas histórias também, mas as questões são: Qual a sua dificuldade com a vida? Você se coloca na posição de vítima, ou está enfrentando suas lutas com unhas e dentes pra ser inspiração para os demais independente de qual luta esteja travando?
Agradeço imensamente a oportunidade de estar nesse dia, nesse lugar e com essas pessoas que me fizeram valorizar mais o que geralmente faço no automático do dia a dia, como sentir a temperaturas, cheiros, sons enfim todos os sentidos. Dia histórico, emocionante e incrível!
Os alunos aprendem cada fase da construção com barro, as terras e as ferramentas usadas
E por fim aplicam a quatro mãos barro para a parede de um banheiro acessível
Todos os participantes reunídos num café de manhã gostoso, festejando uma fértil troca de experiências - Registro Fotográfico: Tania Yoseline Saettone Silva