O BOTO - Alter do Chão
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Cozinhar é identidade - uma amostra da culinária indígena Wai wai

Beijous crocantes e aromáticos feitos por indígenas da etnia Wai wai
Susan Gerber-Barata
mar. 20 - 6 min de leitura
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Quem visitará o espaço etno-culural Yaamo em Alter do Chão, criado como lugar de encontro e acolhimento da cultura indígena, será recebido com o pacote completo. Um conjunto delicioso que reúne cultura e culinária, instigando dessa maneira não só os olhos e os ouvidos, mas também o paladar. Os idealizadores Isanelson Wai wai em conjunto com Simone Sousa e Jarliane Silva em parceria com a agência de turismo e transporte Cuicuera do Deco Lobato idealizaram ao lado da grande maloca do espaço Yaamo, ai fica a casa de farinha dos pais da Jarliane, dona Maria Francimara e senhor José Vasconcelos, uma cozinha indígena improvisada. Mais pra frente os turistas podem experimentar aqui uma original farinhada, assistindo como se prepara nessas bandas a farinha, de maneira ainda completamente manual e artesanal.

Os preparativos para o encontro mais tarde estão a todo vapor. Nem os “descartáveis indígenas”, trançados com folhas frescas de palmeira pouco antes, os beijous e uma bebida feita com goma e bacaba, um parente distante do açaí. Receber os parentes, como os indígenas chamam não só as suas visitas, significa também cozinhar para eles e compartilhar sua comida. Ganharão os turistas pelo estômago! Ainda é muito raro por aí poder degustar comida indígena de verdade! O Boto tinha o privilégio de acompanhar as mulheres Wai wai, especialmente Ipeti Wai wai e Cleide Wai wai no preparo das iguarias que mais tarde serão oferecidas. 

Carinhosamente chamados de "descartáveis indígenas" foram trançados pouco antes com folhas de palmeiras. Aprecia-se o nó delicado que amarra tudo!


Nasce aos poucos um beijou crocante, aromatizado com pedaços de castanha do Pará; servido nos recipientes feitas de folhas de palmeira. A goma com castanha é espalhada por uma folha de bananeira, tampada com outra e assa lentamente na chapa do forno. Se chama Paapa (falado algo com fafá)


Autenticidade é tudo

Quem acredita que para cozinhar bem tem que ter “mão”, carinho e bastante paciência tem que se inspirar na cozinha das mulheres Wai wai. Pode aprender com elas a valorizar o ingrediente em si. Como se faz para o mesmo ingrediente básico rende e brilha nas mais diversas preparações. Os Wai wai conseguem preparar três tipos de beijou diferentes e uma bebida, tudo com uma simples goma de tapioca! Para quem frequenta os mercados do interior da Amazônia encontra ainda uns beijous parecidos com aqueles das mulheres indígenas Wai wai. Mas não tem igual a esses na nossa frente - são fresquíssimos e muito crocantes. Um dos beijous, bem perto da tapioca local, derrete na boca que tão fino, o outro é bem crocante e aromatizado com castanhas. O terceiro é crocante por fora e mole por dentro.

Outro beijou Paapa (falado algo com fafá) cuukmaano

Falta explicar que para obter a goma branquíssima a mandioca, - cuidado eles têm três tipos de mandioca e macaxeira e cada uma serve para outro propósito! - já passou por diversos processos, todos manuais exigindo bastante braço! Foi pubada, ralada e tirado o tucupi no tipiti. Depois o tucupi descansa até a goma se senta no fundo do recipiente, um pó fino cheio de amido e quem cozinha sabe, cheio de truques para poder ser usado devidamente. Autêntico não é só o orgulho, mas também o fato que:

- “Trouxemos tudo da nossa aldeia, a goma, o vinho da bacaba, de uma cor muito mais perto do açaí do que aquela daqui de Santarém e a castanha, gigante comparado com essas que se compra por ai. O que se vende por aí não presta!”

Goma hidratada seca um pouco, a castanha é acrescentada, passa pela peneira, a massa é espalhada e por fim é assado numa grande tapioca no forno de torrar farinha. Quebrado em pedaços é servido aos convidados.

 

Ser receptivo para novos paladares

Trata-se de comida, de comida de coração, todos nós temos a mesma opinião. Comida que nos emociona, que dá saudade é a comida da mamãe. E não fique decepcionado quando o outro, alheia a sua comida, não gosta tanto quanto você dessa sua comida predileta! Paladares tem que ser educados e respeitados. E tem gente que arrisca mais, outros demoram até aprenderem a gostar de uma coisa diferente. Isanelson Wai wai, por exemplo, parece com os típicos paraenses que sempre viajam com pouca bagagem. Compensam tudo com isopores desproporcionais, arrebentados de comidas locais. Isanelson conta que sofreu muito quando ele chegou aqui em Santarém onde ele estranhou demais ter que comer feijão, galinha congelada e a farinha local. Essa farinha que a autora acha uma das melhores da Amazônia. Gostos não se discute! Simone por sua vez levou na sua primeira visita a aldeia sua própria comida e ficou com um pé atrás. A anta que caçaram era tão gorda que nem cozido no feijão conseguiu lhe agradar completamente.

A bebida Yemutu Kuumo Yukun é feita de goma (yemutu), bacaba (suco de bacaba) e água. Lentamente e com bastante braço se incorpore os ingredientes


Carinho e paciência

O que chama atenção no preparo das comidas dos Wai wais que podíamos acompanhar é o carinho e a paciência. Preparar a sua comida parece um ritual, envolve todos. Sempre há crianças, um bebê, ele vai de colo em colo, no meio. Tudo é calmo, cada gesto é preciso, os utensílios usados servem propósitos dos mais diversos. Baldes e vasilhas de plástico, celular convivem harmonicamente com panelas de barro, cuias e recipientes tecidos na hora. O rio constante que as palavras indistinguíveis da sua língua indígena forma, muda conforme necessidade para o português, que todos dominam. Essas mulheres usam sua gastronomia para criar felicidade.

A batata-doce cozida e descascada vira bolinho

























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