A vila está de castigo
Hoje Alter do Chão guarda alguns segredos intrigantes. O que nem todo mundo sabe, é que o lugar, que fica a cerca de 30km da cidade sede, é praticamente isolado de Santarém no quesito administrativo. Uma situação paradoxal, haja vista que o povo original, os Borari, com sua capacidade de acolhimento, tornaram possível a vinda de gente de vários lugares do Brasil que buscavam paz e um lugar para dedicarem seus esforços, recomeçar do zero e claro, ganhar o pão. O que poderia ser uma abertura de portas para o desenvolvimento, na verdade, pelo menos no início, trouxe muita decepção e até hoje é motivo de discussão.
Desde o contato original com povos europeus e mais tarde com pessoas de outras partes do Brasil, o isolamento emocional se tornou a principal arma de defesa. Tratar bem é uma coisa, mas se envolver emocionalmente é diferente.
E é perfeitamente compreensível. Isso porque além de massacrado, o povo original da vila já foi muito enganado ao longo de séculos. Promessas, esperanças e expectativas destruídas ao longo de décadas. O abandono aqui é algo muito triste de se ver. Pior de se sentir. Pior ainda de tentar explicar. E quanto a isso, aí tanto faz ser nascido aqui ou ter escolhido Alter do Chão como lar. Nessa hora, somos todos uma voz só, a lamentar inclusive.
Vergonha alheia que o turista passa
Dizem que conhecemos o dono da casa pelo banheiro. E como então seremos conhecidos, se na ilha do amor nem isso tem? É lamentável ver a situação de muitas pessoas que se deparam com essa "novidade" desagradável. Crianças, pessoas na melhor idade, mulheres que em casos especiais ficam numa situação difícil, pra não dizer constrangedora.
No Sairé ninguém fala da expropriação cultural que tem sido praticada com uma sombra de contravenção. O profano encoberto pelo sagrado . Sabe-se e cala-se. No último ano, em 2023, em plena era digital e com a comodidade dos pagamentos digitais, a moeda física era uma estranha exigência e uma limitação inexplicável. Uma pena ter sido assim, pois ficou mais difícil rastrear a grana e depois prestar contas com a comunidade. E por falar nisso, onde está a prestação de contas? E pra que né, se a festa está fora do controle do povo que a criou...
As 32 ruas que estão asfaltadas no plano diretor de Santarém mas que nunca de fato viram a chegada de asfalto são um fantasma que destrói os carros e ônibus que transitam por aqui. Fala-se e esquece-se. A rota dos ônibus é costumeiramente repensada na marra pois a chuva faz muito mais que molhar as ruas. Elas ficam destruídas.
E aí, o que fazer?
Ah ja sei!! Vamos assorear!! Colocar sempre mais e mais pissarra para que a chuva venha e escorra e leve a lama sempre para o rio, assim as ruas ficam destruídas de novo e assim colocamos mais e mais pissarra pra dentro do rio. Aí depois ninguém sabe porque está um lamaçal na orla de Alter e na praia do Jacundá. Se investirem em asfalto, vão ter que investir em sinalização e fiscalização. O trânsito vai ficar mais rápido e aumenta as chances de acidentes, como aqui a questão da saúde é bem precária, não ter asfalto é a solução pra evitar mais problemas de acordo com a cartilha da incompetência.
A narrativa da desunião que não cola mais...
E os cartolas querem culpar as pessoas daqui. Inclusive querem taxar a população por causa do lixo! Apesar de ter que concordar que em alguns bairros a destinação incorreta do lixo atrai um monte de cachorro, gato, urubu e afins, o problema do lixo está longe de ser causado apenas pela população. Ele é um resultado ocasionado pela falta de uma política bem estruturada de coleta e reaproveitamento de resíduos sólidos e materiais recicláveis. Mas é mais fácil culpar e cobrar mais taxas que pensar numa solução inteligente. Característica da incompetência.
Um outro segredo é que em Alter do Chão hoje vemos uma sinergia muito bonita em efervescência. Quando existem oportunidades de interação, vemos hoje que existe seriedade no tratamento coletivo dos assuntos. Vimos na prática que quando existem formas acessíveis de realizar as coisas, a grande maioria tem se dedicado, como a reforma da praça 7 de Setembro que foi feita com a cooperação de vários empreendedores e moradores que se juntaram para revitalizar a porta de entrada para a Ilha do Amor.
O que o pessoal daqui não gosta é de gente abusada que faz arruaça, que deixa a praia suja com fralda e copo descartável, garrafas de cerveja pela areia e pet de refrigerante boiando na água. A gente não gosta de quem banca o DJ na praia fazendo disputa de caixa de som com músicas de baixo calão, desrespeitando as famílias com crianças e turistas. Não gostamos de quem perturba o sossego das pessoas com som estrondoso até altas horas da noite e nem de quem descarrega suas piscinas nas ruas.
Nós também ficamos indignados quando alguém aponta para nós pelos fatores que são pura incompetência governamental. E quando falo incompetência é para evitar falar que eles fazem um monte de besteira nas poucas vezes que fazem alguma coisa (caixa d'água foi na verdade inaugurada como um chuveiro gigante) e ainda atrapalham quando a vila se organiza pra fazer sozinha. Não fazem, nem deixam a iniciativa dos moradores resolver.
Quando já tem alguma coisa organizada, tem sempre algo para mexer com os ânimos. O ordenamento portuário, que é necessário e muito bem vindo, precisa ser feito com base na realidade local e se haverá realização das lanchas e embarcações de passeio, que sejam oferecidas condições adequadas pra evitar que elas saiam voando quando vier um vento de cima lá no CAT. E por falar nele, tá bem melhor do que estava antes mas bem pior do que poderia ter ficado. A começar pelo piso da ponte que um cadeirante ♿️ sofre na ida e na volta. E aí dele que ouse se segurar no guarda corpo. Pega logo uma felpa de madeira no dedo. Quem gostou da reforma do CAT foram os fãs de HotWheels, que acharam muito legal ver o guarda corpo feito com madeira toda torta. É impressionante mesmo.
O segredo que tá na boca do povo
Sabe, você que está lendo talvez nem tenha ideia, mas é muito difícil conciliar tanta coisa assim num texto só. Imagine na vida diária. Por isso que é importante valorizar as pessoas e suas atividades, para que elas tenham ânimo de fazer além daquilo que é próprio delas. Valorizar a cultura, a culinária, a catraia, o turismo, isso é um papo muito bonito, ainda mais em tempo de eleição. Mas o que pouca gente sabe é que em Alter do Chão estamos todos saturados de ver muito papo e pouca ação.
Esse segredo que Alter esconde é que existe um sentimento de libertação que o distrito de Alter do Chão está cultivando a favor de sua emancipação. Esse ano teremos o divisor de águas para saber que rumos serão tomados. Do jeito que está, já chega. Precisamos tomar a frente e partir para um novo tempo.
Já sabemos como termina a história da galinha dos ovos de ouro e antes que matem Alter, levantamos uma voz que ecoa desde o tempo dos antepassados do povo borari, que juntou-se a de todas as etnias e moradores para declarar que Alter do Chão merece respeito. E logo em breve nós estaremos no legislativo com um representante credenciado pelos habitantes daqui e vocês conhecerão a voz de Alter do Chão.